A psicóloga mexicana Blanca Rios é a atual presidente do Comitê de Saúde Integrada da IFSO – International Federation for the Study of Obesity e estará presente no XVI Congresso da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.
Como aquecimento para o evento, que será histórico, conversamos por e-mail com Blanca para entender melhor o papel da psicologia no tratamento cirúrgico da obesidade.
Entre os temas estão o preconceito e os mitos que cercam a área, estigmatizada como “coisa para loucos”, e a importância para promover a mudança para um hábito de vida saudável. A baixa adesão também foi assunto na entrevista, que teve a participação especial de Isabel Paegle, psicóloga e integrante da COESAS-SBCBM.
“Uma das principais dificuldades é que o paciente emagrece, cumpre seu objetivo e depois não volta para a sessão. Isto torna difícil o acompanhamento em longo prazo.”
Confira o papo na íntegra, abaixo.
SBCBM – Muitas pessoas ainda têm resistência quando o assunto é psicoterapia e psicologia. Na sua avaliação, por que isto acontece?
Blanca Rios – Considero que existem muitos mitos sobre a área de psicologia porque as pessoas, em geral, a associam com a “loucura”. Elas temem terem situações de sua vida descobertas e o paciente obeso geralmente não quer que toda a parte emocional que ele encobre com sua “capa de gordura” seja descoberta, já que em muitas ocasiões se sentem vulneráveis perante os demais e por isso resistem ainda mais a receber este tipo de tratamento.
No entanto, quando alguém proporciona informações adequadas ao paciente sobre a cirurgia, mudanças e o porquê da ajuda psicológica, a ansiedade do paciente obeso diminui, assim como suas dúvidas, e eles aceitam participar.
SBCBM – Em termos práticos, como a psicologia pode auxiliar a equipe multidisciplinar na cirurgia bariátrica?
BR – Acredito que a obesidade, por ser uma doença multifatorial, tem um componente psicológico muito importante. A área da psicologia deve apoiar nas avaliações pré-cirúrgicas e determinar se o paciente se encontra em condições para uma cirurgia bariátrica ou se necessita de maior preparo. Mais importante é o pós-cirúirgico, em que deve haver um acompanhamento em longo prazo e auxiliar o paciente a mudar seu estilo de vida de forma geral. Estas informações serão muito úteis para toda a equipe multidisciplinar para o entendimento e o trato com o paciente.
SBCBM – Uma das principais demandas dos psicólogos que atuam na área de cirurgia bariátrica é o curto tempo para avaliação e análise dos pacientes. Em sua visão, como isso afeta o tratamento cirúrgico da obesidade?
BR – Considero que, se o paciente já tomou uma decisão tão difícil na sua vida de se submeter a uma cirurgia bariátrica, não podemos fazer que ele espere muito tempo. Ainda mais quando sabemos que existe a possibilidade de melhorar sua qualidade de vida depois da cirurgia.
A espera pode começar a causar ansiedade, dúvidas e receio do procedimento, fazendo com que ele continue obeso ou tentando métodos “mágicos” para emagrecer.
Creio que duas a quatro sessões iniciais de avaliação podem ser suficientes. Se existir dúvidas, podem ser feitas mais um par de sessões ou algumas provas psicológicas.
SBCBM – Qual a importância do consenso de psicologia na cirurgia bariátrica?
BR – Considero muito importante. Há poucos documentos a respeito elaborados com profissionais que realmente estejam envolvidos na cirurgia bariátrica. Isto já ajudou a determinar diretrizes para o melhor tratamento do paciente obeso.
SBCBM – Como você faz a avaliação psicológica de seus pacientes? Quantas consultas são necessárias no pré e pós operatório?
BR – Em geral, faço duas entrevistas iniciais. Após da cirurgia faço uma visita ao quarto do paciente no hospital e depois de 15 ou 20 dias de operados volto a receber os pacientes no consultório.
As sessões são a cada oito dias nos três primeiros meses, já que a perda de peso mais significativa ocorre neste período. Depois é feita uma avaliação para saber se os encontros devem ser mantidos assim ou se podem ser feitos a cada 15 ou 20 dias.
A idéia é acompanhar os pacientes pelo menos por um ano e meio. No entanto, uma das principais dificuldades é que o paciente emagrece, cumpre seu objetivo e depois não volta para a sessão. Isto torna difícil o acompanhamento em longo prazo.
SBCBM – Quais são as principais complicações psicológicas de pacientes bariátricos?
BR – Atualmente estamos enfrentando problemas pós-cirúrgicos como transtornos de conduta alimentar, o reganho de peso, o abuso do álcool e a necessidade de cirurgias de revisão.
SBCBM – Como lidar da melhor maneira com pacientes bariátricos? Existem linhas específicas da psicologia para esta área?
BR – Foi feito um consenso no Congresso Nacional do Colégio Mexicano de Cirurgia Bariátrica, em 2010, e um consenso latino americano com opinião de experts de diversos países da região, realizado no Congresso Latino Americano da IFSO, na Colômbia, em 2011. Guias clínicos também foram elaborados e estão disponíveis em www.psicologiabariatrica.org. Todos eles sobre a avaliação e o tratamento do paciente bariátrico.
SBCBM – Qual o entendimento da IFSO da importância da psicologia no tratamento cirúrgico da obesidade? Existe algum país que se destaque neste sentido?
BR – A IFSO tem dado a oportunidade e a abertura para mostrarmos nosso trabalho. Temos recebido muito apoio da entidade.
Acredito que cada país tem desenvolvido mais áreas que outras e cada um têm um espaço muito importante para contribuir para que, juntos, criemos um todo. Os colegas que tem participado mais ativamente nos congressos são os argentinos, brasileiros, chilenos e mexicanos.
SBCBM – Qual sua expectativa para o XVI Congresso da SBCBM?
BR – Conhecer muitos colegas e compartilhar nossas experiências para enriquecer cada dia mais esta área tão necessária que é a cirurgia bariátrica.
Sei que é um grande evento, de grande interesse para a América Latina e que terá grande impacto como nos outros anos.