Angelina Jolie descobre que tem um gene para o câncer de mama, o mesmo gene que causou a morte precoce da sua mãe. Ela decide fazer uma prevenção proativa e possivelmente radical: uma mastectomia bilateral. Fazendo isso, ela diminui o seu risco de ter um câncer de mama de 70% para 5%. Nenhuma garantia absoluta, mas definitivamente isto melhora suas chances de sobrevivência. Claro, se partirmos do pressuposto de que ela continue suas mudanças no estilo de vida que promovam a sua saúde.
Então enquanto todo mundo está debatendo a sabedoria, seja da sua decisão ou da forma aberta de falar sobre isso, eu fico pensando comigo mesmo sobre os pacientes de cirurgia bariátrica.
A obesidade moderada ou extrema aumenta exponencialmente as chances de morrer de todas as doenças. Da mesma forma que ter um gene para câncer aumenta a chance de morrer daquele câncer.
Nós temos evidências cientificas suficiente de que a obesidade não é gulodice, mas uma doença crônica e de difícil controle devido a uma fisiologia alterada. Geneticamente as coisas não estão normalmente trabalhando a favor do emagrecimento. Fisiologicamente o seu corpo quer sempre reganhar o peso que você perdeu. Psicologicamente essa luta é extenuante.
Algumas pessoas irão perceber que seu peso está além do seu controle. Elas reconhecem o curso ladeira abaixo das doenças associadas, a marcha em direção de uma morte precoce, e escolhem um procedimento radical para mudar esse curso. Cirurgia bariátrica não é isenta de riscos, e nem sempre funciona bem, mas as chances de aumentar a qualidade de vida melhoram dramaticamente quando a cirurgia é feita com sucesso. Supondo que o paciente possa continuar as mudanças no estilo de vida necessárias para garantir uma boa saúde, claro.
Viram o padrão?
É preciso uma dose extraordinária de coragem para dizer: “eu tenho um risco de doença e não quero sucumbir a isso”.
É preciso uma dose extraordinária de coragem para fazer uma cirurgia radical e prevenir uma morte precoce.
É preciso uma dose extraordinária de coragem para encarar sua mortalidade, utilizar realisticamente a capacidade da medicina moderna de salvar você, e seguir em frente com uma opção de mudar de vida.
É preciso uma dose extraordinária de coragem para mudar o seu estilo de vida e não olhar para trás.
Aqui não há uma decisão certa. A decisão certa é aquela que funciona melhor para o paciente individualmente, aquela em que ele possa se adequar e viver com ela, aquela que se adapte ao seu estilo de vida, aquela que o mova para longe de uma doença mortal.
Eu defendo Angelina Jolie e sua decisão de fazer a cirurgia e salvar sua vida. Não há garantias. Angelina Jolie pode ainda necessitar de tratamento médico para câncer, e pacientes de cirurgia bariátrica podem ainda precisar de tratamento para obesidade.
Para os cientistas do mundo, peço mantenham as pesquisas. Para os médicos do mundo, peço mantenham-se atualizados e abertos às possibilidades. Para os pacientes do mundo (e esses somos todos nós), peço fiquem orgulhosos da sua coragem, a despeito da sua decisão, e permaneçam vigilantes.
Essa é a única garantia que eu tenho para vocês.
Sara Stein, médica psiquiatra. Autora do livro Obesity from the Heart
Tradução Orlando Pereira Faria
Fotos: Gage Skidmore (via Wikpedia) / Candian Obesity Network